quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Minha querida Clarice Lispector.

“Quando criança, e depois adolescente, fui precoce em muitas coisas. Em sentir um ambiente,
por exemplo, em apreender a atmosfera íntima de uma pessoa. Por outro lado, longe de
precoce, estava em incrível atraso em relação a outras coisas importantes. Continuo,
aliás, atrasada em muitos terrenos. Nada posso fazer: parece que há em mim um lado
infantil que não cresce jamais.
Até mais que treze anos, por exemplo, eu estava em atraso quanto ao que os americanos
chamam de fatos da vida. Essa expressão se refere à relação profunda de amor entre um
homem e uma mulher, da qual nascem os filhos. Depois, com o decorrer de mais tempo,
em vez de me sentir escandalizada pelo modo como uma mulher e um homem se unem,
passei a achar esse modo de uma grande perfeição. E também de grande delicadeza.
Já então eu me transformara numa mocinha alta, pensativa, rebelde, tudo misturado
a bastante selvageria e muita timidez.

Antes de me reconciliar com o processo da vida, no entanto, sofri muito, o que
poderia ter sido evitado se um adulto responsável se tivesse encarregado de me contar
como era o amor. Porque o mais surpreendente é que, mesmo depois de saber de tudo,
o mistério continuou intacto. Embora eu saiba que de uma planta brota uma flor,
continuo surpreendida com os caminhos secretos da natureza. E se continuo até hoje com
pudor não é porque ache vergonhoso, é por pudor apenas feminino.

Pois juro que a vida é bonita.”
  

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